O naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853) faz parte daquele grupo fascinante de cientistas que transformaram o mundo em seu laboratório. Botânico, sua obra ficou eternizada no nome científico das muitas espécies que descobriu e descreveu. Pode-se dizer que ele dedicou a vida às plantas e ao Brasil, onde chegou com 37 anos, viajou durante 6 anos e recolheu uma coleção fabulosa: 30 mil exemplares de plantas de 7 mil espécies, das quais 4.500 até então desconhecidas. O estudo desse acervo foi a razão de sua vida depois que voltou à França.
Saint-Hilaire escreveu vários livros sobre as pesquisas e as viagens. Esses livros são leitura saborosa, além de documentos preciosos sobre o Brasil do princípio do século 19. Saint-Hilaire era um observador minucioso, preocupado em fazer o leitor “viajar” com ele. Por isso, os relatos são sempre enriquecidos com lições de história, geografia, sociologia e antropologia. Saint-Hilaire era um humanista exemplar, capaz de se envolver, pesquisar a fundo, criticar, sugerir e se apaixonar pelo que via. Mesmo quando expunha as mazelas do Brasil daquela época, ele se expressava de uma forma supreendente para um estrangeiro, demonstrando carinho e preocupação com o futuro do País. Conhecia muito bem o nosso idioma, chegando a explicar a origem das palavras e discorrer sobre diferenças regionais de pronúncia. Também é surpreendente a consciência ecológica dele, numa época em que a palavra ecologia nem existia. Quando viajava do Rio de Janeiro para Goiás, ele condenou a agricultura baseada nas queimadas, dizendo que quem assim o fazia estava prejudicando as gerações futuras.
Saint-Hilaire pode ser considerado tambem um pioneiro do turismo ecológico. A caminho de Goiás, ele desviou-se do roteiro só para ver uma cachoeira, a Casca D’Anta, primeira grande queda do rio São Francisco na serra da Canastra, diante da cachoeira, ele fez a seguinte descrição:
Depois ele conheceu o alto da Serra da Canastra e fez de tudo uma descrição entusiasmada. Essa passagem pela região deu título ao livro “Viagem às nascentes do Rio São Francisco e Província de Goiás”, publicado em Paris em 1847. Não é à toa que de todos os livros resultantes da viagem ao Brasil, esse é o único que faz referência a um rio no título.
A visita à Serra da Canastra foi em 1819. E ainda hoje, quase dois séculos depois, a descrição histórica de Saint-Hilaire continua sendo um retrato fiel da paisagem bem preservada da região. É uma descrição simples, porém exata, carregada de uma emoção ainda capaz de contagiar o leitor.
As mesmas plantas e flores dos campos e cerrados que encantam os turistas de hoje, surpreenderam Saint-Hilaire.
Até para os moradores simples e pobres da Canastra, ele reservou palavras de carinho. Num tom melancólico e saudosista, escrevendo em Paris, ele se referiu assim ao homem que o hospedou aos pés da cachoeira Casca D’Anta:
VÍDEO: Produção refinada e emocionante sobre o botânico e viajante francês Auguste de Saint-Hilaire, autor de um dos mais belos textos sobre a Serra da Canastra.
O naturalista francês Auguste de Saint-Hilaire veio ao Brasil em 1816 e aqui permaneceu até 1822. Em 1819, foi à Serra da Canastra, MG, conhecer as nascentes do rio São Francisco. Como em todas as suas viagens, Saint-Hilaire fez um relato minucioso dos locais por onde passou, e ficou encantado com a cachoeira de Casca d’Anta, um dos mais belos monumentos naturais brasileiros. O vídeo celebra os 200 anos dessa viagem.
créditos: Fauna Brasil – UFF
Livro Recomendado
Na apresentação do livro “Viagem às nascentes do Rio São Francisco” (edição USP/Itatiaia), o resenhista Vivaldi Moreira define: ” …Veio (Saint-Hilaire) em nome de uma doutrina que santifica os homens, que os eleva na consideração dos séculos, que os imortaliza na memória da posteridade. (…) Com amor à terra visitada compôs sua obra, hoje monumento erguido à ciência, catálogo de nossas riquezas, mapa vivo de nosso passado.”
Desenhos/plantas: “Plantas do Brasil/Espécies do Cerrado”, de Mário G. Ferri