Projeto Piloto tem o objetivo de formar cidadãos que valorizem a cultura local e a arte do queijo , segundo as boas práticas de fabricação
Por Maria Teresa Leal
Foto: Acervo Aprocan / Legenda: Seu “Zé Mário” ensinando as novas gerações os segredos do Queijo Canastra
Alunos da Cooperativa Educacional Sarom, de São de Roque de Minas, na Serra da Canastra, com idades entre três e 17 anos, aprendem matemática, biologia, química, geografia e ciências como quaisquer outras crianças e adolescentes. Mas com um diferencial: o tema “queijo” permeia todas as disciplinas, sempre que possível. “Introduzimos exemplos ou informações pertinentes, relacionadas ao queijo, que é a principal marca da nossa região”, conta a diretora Maria José Faria Leite. As crianças também têm aulas práticas em salas de ordenha e no laboratório onde aprendem a importância do cuidado com os animais e com a higiene, na manipulação do leite e os outros ingredientes.
Não se trata de bairrismo. Ela explica que, durante muito tempo, São Roque foi uma cidade com predominância de aposentados. Como não havia infraestrutura adequada e muitas perspectivas de trabalho, os jovens iam estudar fora e não voltavam. As coisas só começaram a mudar com a criação da Sicoob Saromcredi, hoje Sicoob Sarom, cooperativa de crédito fundada por produtores rurais, entre eles o atual presidente João Carlos Leite.
Conhecido como “Joãozinho da Canastra”, ele fundou a Aprocan (Associação dos Produtores de Queijo Canastra) que conta com a parceria de instituições como o Sebrae, a FAEMG (Federação da Agricultura do Estado de Minas Gerais) e a própria Cooperativa de Crédito que, juntas, conseguiram resgatar o “fazer artesanal do queijo” e impulsionaram a atividade na região.
Hoje, o ‘Canastra’ é um produto, conhecido, premiado e valorizado em todo o mundo. Recentemente foi eleito pelo site Taste Atlas (que se auto intitula o ‘Atlas da Comida Mundial’) como ’o melhor do mundo’, sem falar nas inúmeras premiações internacionais, obtidas, individualmente, pelos produtores locais. “Sentimos necessidade de dar a devida importância a essa história, de fazer com que nossas crianças e jovens a conheçam, valorizem o queijo, saibam produzi-lo e, se assim o desejarem, trabalhem com ele no futuro”. Segundo Maria José, a intenção não é formar queijeiros. O importante é os alunos se orgulhem do lugar e da cultura na qual estão inseridos.
A iniciativa – batizada de ‘Chefs da Canastra’ até o 9° ano e, a partir daí de Agroeconomia, tem tido boa aceitação entre os alunos. Afinal, todos os 136 estudantes são filhos de queijeiros ou têm algum parente, amigo ou vizinho que é ou, pelo menos, foi queijeiro. Esse é o caso da estudante Renata Silva Faria, de 16 anos, aluna do 2° ano do Ensino Médio da Cooperativa. Filha de uma contadora e um despachante, ela conta que seus avós produziram queijos durante muito tempo e, apesar de, na família, ninguém trabalhar com a atividade no momento, todos sabem fazer a iguaria.
Renata aprova a ideia da temática do queijo artesanal estar inserida no conteúdo das disciplinas regulares por que isso cria um link com realidade deles. “Como é algo familiar, automaticamente, estabelecemos uma conexão”, explica. E as aulas práticas? Ela adora e diz que a turma toda se diverte colocando a mão na massa. Renata conta que a primeira vez que conseguiu fazer o seu próprio queijo, no tamanho batizado de “merendinha”, sentiu orgulho e uma tal de ‘sensação de pertencimento’. “Esse é o meu universo”, disse para si mesma, na ocasião. A estudante já sabe que profissão quer seguir: publicitária. “Quem sabe não farei campanha para grandes empresas ou produtores de queijo da região?”, cogita.
Cuidado com os animais
As aulas práticas de produção do queijo para as crianças e adolescentes são ministradas pela zootecnista Valéria Rodrigues e pela médica-veterinária Brenda Macedo (ex-aluna da Cooperativa) na sala de ordenha e na queijaria da fazenda Roça da Cidade, parceira do projeto. A professora Valéria conta que os alunos da Cooperativa adoram estar perto das vacas, aprender sobre a importância do cuidado com elas e as aulas no laboratório onde acompanham, de perto, as análises microbiológicas do leite para saber se a matéria-prima está dentro dos padrões exigidos pelos órgãos competentes. “Quando crescerem eles saberão a importância do capricho, da higiene e do amor durante o processo de feitura do ‘melhor queijo do mundo’”, diz Valéria.
Joãozinho se enche de orgulho ao ver as crianças amassando seus queijinhos. “Esse é o meu legado para as gerações futuras. Quero que amem, protejam e perpetuem o queijo Canastra e toda a cultura que gravita em torno dele, junto com os benefícios, as riquezas e alegrias que ele nos traz”. Maria José, por sua vez, espera que o “Chefs da Canastra’ sirva de inspiração para outras escolas que desejem valorizar seus produtos, suas identidades e culturas locais.
Fonte: Itatiaia